OESCAMBAL
terça-feira, novembro 07, 2006
Caio Ricardo Bona Moreira

O MISTERIOSO CASO DO SEU NEMES



Seu Nemes era o funcionário mais simpático da repartição. Faltavam dois anos para que se aposentasse. Todos já lamentavam a triste despedida que se anunciava. Antes das férias, nos finais de ano, era sempre o bom velhinho que ganhava a medalha “honra ao mérito-destaque do ano”, idealizada por dona Lizete, a funcionária mais antiga, com o objetivo de incentivar o bom desempenho e motivar o grupo – ela nunca perdia aqueles cursos do Sebrae que a empresa patrocinava.

É claro que surgiram boatos quando ela inventou o tal prêmio. Funcionários públicos adoram café, folgas e rumores. Os mais jovens cochichavam que a solteirona inventara o tal prêmio só para seduzir o senhor Nemes, um sessentão “enxuto”, já que era somente ele quem sempre levava as medalhas. Mas ninguém contestava a unanimidade da escolha, nem a veracidade da apuração dos votos contabilizados por Leonora, filha mais velha do chefe. Era porque só ele, no fundo, era o verdadeiro merecedor de tal honraria, então, ninguém discordava abertamente. Os anos iam passando e ninguém esperava mais levar a “bola da vez”.

Quando faltavam seis meses para o seu Nemes receber a aposentadoria, coisas estranhas começaram a acontecer na repartição, e todos sabiam que a culpada era a dona Lizete, que no último amigo secreto, descobriu quem tinha sorteado o nome de seu Nemes. Subornou o Marquinhos, office-boy novato, com um par de havaianas que tinha comprado para o neto e não servira. Comprou o acaso e guardou o papelzinho no bolso.

Desde que conhecera o seu Nemes, ficara sabendo que ele gostava muito de ler. Nemes vivia comprando aqueles livros de caubói (Tex, é esse o nome, ou Ted? Não importa); era assinante da revista Seleções. Era hora de conquistá-lo. A dona Lizete havia lido uma resenha escrita no Diário Catarinense. Pois bem, o cara citava um escritor chamado Herman Melville. Dona Lizete, que era dada à culinária e cruzadinha e não à literatura, anotou o nome “Bartleby” numa cadernetinha que sempre carregava na bolsa. Ela não tinha entendido nada daquela resenha, mas resolveu seguir a intuição. Gostara do texto e mais ainda do nome: “Engraçado, a gente não entende, mas gosta, esses caras do jornal sabem dizer bonito, né?!”, confessou para Inês, sua cabeleireira e confidente. Comprou o Bartleby para o seu amigo secreto.

Como de costume, o seu Nemes agradeceu o presente, abraçou forte a velhinha, que quase desmaiou de emoção: “O que a gente não faz pra agradar o ser amado?”. Muito prestativo, o Nemes se ofereceu para levar a dona Lizete pra casa. Chovia muito naquele dia, como poderíamos esquecer? O que se passou na casa da nossa colega de trabalho nunca nos foi revelado. Só sabemos que ele começou a se comportar de uma maneira muito estranha. Talvez você entenda melhor do que eu.

O seu Nemes nunca mais foi o mesmo. A velhinha, que no dia seguinte chegou antes dele, sorria como uma cotia (cotia sorri?). E ela foi a primeira que estranhou o comportamento do homem. Ele resmungava e ela chorava pelos cantos do escritório. Teria sido estuprado pela velhinha? Teria experimentado os seus dotes culinários? Teria ficado traumatizado ao ver a dona Lizete despida de qualquer aparato ou pudores? Preferia não ter nascido. Quem? Ela ou ele? Talvez os dois, a partir daquela semana. Quando solicitavam algum serviço de banco, ou mesmo o preenchimento de algumas fichinhas de nada, o seu Nemes só dizia: Eu prefiro não!

O que estava acontecendo com o bom velhinho? Seria melhor se ele tivesse dito: “Ai, que preguiça!”, como um bom ser macunaímico e malandro que todos somos, frutos desse Brasil imenso de Andrades e Almeidas; ou então: “Vai para aquele lugar!”. Todos entenderíamos e forjaríamos as nossas hipóteses: “Ah, a idade tem dessas coisas!”, ou mesmo: “a dona Lizete depenou o nosso bom e velho Nemes!”. Mas não: “Eu prefiro não!”. E a frase foi para nós uma facada no coração, um soco na boca do estômago. Foi que de tantos “eu prefiro não” o cara acabou sendo demitido por justa causa. Comenta-se que nunca mais saiu de casa. E o pior, depois que terminou de ler o Melville, não quis ler mais nada. No último aniversário, três meses antes de morrer, ganhou do ex-chefe a antologia completa do Olavo Bilac, presente de consideração por tantos anos de dedicação. Olhou triste para todos e lá veio: “eu prefiro não!”. Devolveu o presente. A Leonora, indignada, deu o troco, pegou de volta a caixa com aquelas preciosidades parnasianas e nunca mais voltou a olhar para o seu Nemes. Seu Nemes nunca mais. Ele não quis fazer mais nada.
O único que entendeu tudo foi o Marquinhos, que adorava o Melville. Ele costumava dizer que o seu Nemes sofrera de um caso raro de distúrbio literário, uma doença ainda não diagnosticada: “personagium patologicus”. Ei, avante: ‘eu prefiro não!”. E bateu as botas nosso Nemes Bartleby.

caio ricardo bona moreira 8:26 AM



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orig.obsc.; talvez relacionado com a raiz de cambada, com alt. de sufixo para -al 'grande quantidade' e depois grafado com -u, seguindo a pronúncia do -l final, predominante no Brasil, *os cambal > *o scambal > o escambau, ou ainda da raiz de 1cambo/1camba, por processo semelhante; levantou-se ainda a possibilidade de o voc. originar-se de *os cambau > *'s cambau > *scambau > escambau, hipótese que se poderia admitir do ponto de vista da fonética sintática, mas que seria de difícil sustentação do ponto de vista semântico.pode significar ao mesmo tempo: algo que não é verdade, grande quantidade, uma coisa incrível ou a expressão "e muito mais" ... e o escambau
(...)
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